Hotel Califórnia
Por Alexandre Schwartsman1
You can check out any time you like, but you can never leave – Eagles

Bem-vindos a 2025, embora o final de 2024 tenha levantado não poucas lebres sobre o que esperar deste ano. Dois temas, acredito, marcarão o período.

O primeiro é o retorno de Donald Trump à presidência dos EUA e suas implicações. Ainda que Trump, fiel a seu estilo, siga produzindo mais fumaça que fogo, mais recentemente com seus posts sobre a Groenlândia e o Canadá, a direção geral de sua política econômica parece dada, embora os detalhes – onde o diabo costuma fazer morada – permaneçam obscuros.

Não acredito que a ameaça das tarifas seja apenas uma ameaça, ou melhor, um instrumento de negociação. Há 40 anos, muito antes da carreira política, Trump já pedia tarifas mais altas, à época sobre as exportações japonesas, e as elevou em seu primeiro mandato. Tudo indica, portanto, que devemos esperar ações no sentido de impor restrições às exportações para o mercado americano, em particular no caso da China, embora ninguém deva acalentar a ilusão de que passarão incólumes pela fúria protecionista.

Mesmo com certa apreciação compensatória do dólar face a seus principais parceiros comerciais, que ajudam a moderar os preços no mercado americano, isto deve fazer com que preços de produtos importados – assim como seus similares americanos – subam, impactando os índices de preço.

Por mais que, a princípio, isto não configure exatamente um processo inflacionário, pois falamos aqui de um aumento que ocorre de uma única vez, há também nos EUA alguns mecanismos de indexação que tendem propagar este choque inicial. De modo similar, as condições atuais da economia americana, caracterizada por operar próxima, senão acima, do pleno-emprego, favorecem o repasse do aumento dos preços. Isto dificulta e atrasa a convergência da inflação à meta, aumentando inclusive o risco que tal convergência não se materialize.

Adicionalmente, espera-se que Trump prorrogue as reduções tributárias criadas ainda em seu primeiro mandato, agendadas para terminar em 2025, além de criar estímulos fiscais. Com a economia bastante aquecida e o mercado de trabalho apertado – mesmo menos do que em 2022 e 2023 – há o risco de dificultar ainda mais a convergência da inflação.

Por fim, embora em prazo mais longo e mais sujeito à incerteza, as medidas contra a imigração reduzem a oferta de trabalho, fenômeno que também não auxilia a queda da inflação.

O resultado, em função destes desenvolvimentos, se manifesta nas revisões quanto à trajetória da política monetária. Enquanto o mercado chegou a colocar nos preços quatro, talvez cinco rodadas de redução em 2025, os preços de hoje apontam para apenas duas, ou melhor, uma em meados do ano e chance razoável de uma segunda mais para seu final, em linha com o sinalizado pelo Federal Reserve em dezembro do ano passado.

A mudança das perspectivas quanto à evolução da política monetária americana, somada à fraqueza das demais economias desenvolvidas, com destaque para a Zona do Euro, criou um ambiente favorável ao dólar, que hoje opera em quase paridade com o euro. Dólar forte e juro mais alto serão, portanto, características de 2025, em larga medida resultado do novo governo Trump.

Já o segundo tema diz respeito ao Brasil, em particular no que se refere à política fiscal.

A verdade é que o atual governo “trocou o pé”, iniciando seu mandato com aumento praticamente sem precedente dos gastos permanentes, concentrados nas transferências a famílias (aposentadorias e pensões, BPC, Bolsa-Família, abono salarial, seguro-desemprego seguro defeso etc.).

Tais transferências implicaram forte estímulo ao consumo, principal fator de aumento da demanda e da atividade nos dois anos de governo. Por outro lado, trouxeram de volta os déficits primários e, com ele, o aumento persistente da dívida. Dada, ademais, sua natureza, não há como alterá-las em prazo curto, ou seja, os desequilíbrios orçamentários são de difícil e demorada correção, mesmo que a administração resolva fazê-la, o que não é, nem de longe, óbvio.

Não contemos, portanto, com qualquer progresso relevante no que se refere às contas públicas e à evolução da dívida.

O contexto global ajudou a revelar esta inconsistência. Suas implicações são o dólar acima de R$ 6,00 e os juros em alta.

A inflação, alimentada tanto pelo dólar como pelo excesso de demanda, voltou a subir e deve se manter acima do limite superior do intervalo de tolerância da meta na maior parte de 2025, motivando o Copom a elevar a taxa de juros para 15% ao ano.

Não nos parece que mesmo tal elevação de juros possa conter a expansão do consumo, dado que as transferências governamentais devem seguir em alta, ainda que menos intensa na comparação com 2023 e 2024. Na verdade, politicamente o governo não pode admitir uma desaceleração forte da economia em 2025, o que ameaçaria seus planos para reeleição (ou eleição de um sucessor em 2026).

Embora o ritmo de crescimento da demanda (e do PIB) deva ser algo menor do que em 2024, não vemos elevação significativa da taxa de desemprego em 2025 e 2026. Assim, a inflação provavelmente permanecerá acima da meta nestes dois anos.

Neste cenário, cabe ver como o BC reagirá. Em que pese o compromisso de duas rodadas de elevação de juros em 1 ponto percentual nas duas primeiras reuniões do BC, seguidas de algum ajuste fino nas duas reuniões seguintes, o Copom deverá seguir sob pressão, em particular na segunda metade de 2025, período crucial para estimular (ou não) a economia em 2026 e facilitar a tarefa do governo.

Caso ceda às pressões, os riscos são novas rodadas de desvalorização do real e tensões inflacionárias ainda mais fortes. Honestamente, dado o histórico do novo presidente do BC, temo que este risco seja bastante real, mas, por enquanto podemos dar-lhe o benefício da dúvida até prova em contrário.

Tudo isto não sinaliza um bom ano para a Bolsa local, assim como para ativos de risco em geral. Com o CDI firme na casa de dois dígitos, bastante superior à inflação, e títulos indexados pagando prêmios substanciais, a renda fixa local parece muito atraente.

Aqui na Portogallo Family Office, manteremos a estratégia de CDI Plus com um olho no Banco Central para eventualmente migrar para papéis atrelados ao IPCA caso as manobras de manter os juros artificialmente baixos do governo Dilma-Tombini sejam repetidas.

Não há como escapar de 2025, mas podemos nos defender dele.

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